terça-feira, fevereiro 06, 2007

E porque não um referendo para abortar o referendo?

Concordo contigo, João, quando afirmas que a questão é complexa, e que há argumentos lógicos em ambas as facções. No entanto, isso foi o que menos se viu na campanha (e na pré-campanha, e nos meses todos em que esta agitação durou).

Este referendo sobre a IVG levanta, no meu ponto de vista, demasiadas reservas. Passo a explicar:

1) A responsabilidade. O argumento "economicista", imediatamente flagelado pelos apoiantes do "Sim" e pela esquerda do costume (a das grandes causas), é um dos mais lógicos, e precisamente aquele que fica por esclarecer. Ora, estou em crer que esta questão, se esclarecida, poderia mudar o sentido de voto de muito boa gente. A verdade é que não sou de todo a favor da prisão para uma mulher que aborte (já para as parteiras de vão-de-escada... adiante). Mas também não sou a favor de que a coisa seja patrocinada pelo Sistema Nacional de Saúde. A verdade é que o acto sexual deve ser responsável. E quem o pratica deve (ou deveria) estar bem ciente das responsabilidades que isso pode implicar. Lamento, mas as historietas rocambolescas de adolescentes que não tomam qualquer cuidado na fornicação não me comovem. Se foram irresponsáveis, ao menos que assumam as consequencias de forma responsável. E se isso implicar abortar, então que paguem por isso.

E não me venham com a história do "se fosse contigo queria ver", porque sinceramente eu, caso acontecesse, estaria disposto a assumir a responsabilidade, qualquer que ela fosse. Nem com a história do "se apanhares uma doença por fumares é o SNS quem paga o arranjo nos pulmões". Se paga, está mal; a escolha foi minha. Por isso sinto os sistemas de seguros de saúde americanos tão "apelativos".

2) A hipocrisia do governo. Se o governo socialista, personificado pelo Engenheiro Sócrates, é apoiante do "Sim", e se está tão convicto de que essa é a vontade do povo português, porque não resolveu a coisa na Assembleia da República? Têm maioria absoluta; e tanto o Bloco como o PCP iriam apoiar.Poupar-se-ia dinheiro e tempo de antena. Mas, bem vistas as coisas, o tema serve na pereição para o Governo: alguém reparou no aumento de preços do início de ano?

3) A pergunta. Nada explica, como é evidente. Voltamos ao início: se o "Sim" ganhar, como vai o aborto ser legislado? Quem vai financiar? Onde vai ser permitido?

4) O futuro. Se o "Não" sair vencedor deste referendo, daqui a oito anos voltamos à carga? Estranha democracia, a nossa: o povo vai a votos, mas vota até acertar. Quase parece a União Europeia com o tratado constitucional. Se o "Sim" ganhar, o que irá acontecer?

Por tudo isto, votaria "Não" caso fosse às urnas. Sou contra a prisão das mulheres, mas também sou contra um aborto free-for-all, irresponsável. E não gosto de cheques em branco - já basta aqueles que de cá saem de quatro em quatro anos, nas legislativas. Não votarei, porém, porque não me dá jeito fazer 250 kms para ir à santa terrinha. E, sinceramente, o tema, e a forma como foi tratado, não me merece o esforço.

E sim, estou de volta ao blog.

João Campos