segunda-feira, setembro 26, 2005

Understanding the ununderstandable

Foi através da Patrícia que comecei a fazer surf. E da SurfPortugal nº 100 (edição especial),o primeiro exemplar da revista a que tive acesso, que por acaso foi ela que me deu a ler. Uma belíssima edição, com fotografias magníficas e textos profundos sobre o acto de fazer ondas. Lembro-me (só a memória me resta; o exemplar que comprei para mim emprestei a um membro da tribo e nunca mais os voltei a ver a ambos) de que o artigo de capa consistia num conjunto de textos entitulados pelos vários significados possíveis que se pode atribuir ao acto de desafiar os oceanos em cima de uma prancha. E lembro-me também, como é evidente, dos textos de que mais gostei: um tinha como título “Diversão”, o outro “Aventura” . Uma fotografia da Patrícia a executar uma batida vertical, tirada pelo australiano Joli (um dos mais conceituados fotógrafos de surf da actualidade) numa qualquer praia da Austrália, ilustrava o texto que falava do surf como “Competição”.
A Patrícia foi minha professora de educação física durante 2 anos, no secundário (bom, na prática terão sido 3, porque, apesar de ter mudado de turma no último ano, à força de ter optado – como mais meia dúzia de colegas apenas – pela renegada da Filosofia, o jeito para a bola garantia-me sempre um lugarzinho entre a rapaziada da turma de Artes, à qual a Patrícia dava aulas à mesma hora). Pratica surf há mais de vinte anos (desde os dezoito), é campeã nacional da modalidade há mais de dez. Também corre o circuito mundial (ou corria, na altura; não sei se entretanto parou), e por isso, quando chegava Dezembro, já todos sabíamos que íamos ser dispensados das aulas de educação física por duas semanas. A Patrícia chegava e dizia: “Não vou poder dar aula nas próximas semanas porque vou estar em competição. Parto amanhã para o Hawai”. A maioria da turma (sobretudo raparigas) recebia a notícia com alegria. Eu, nem por isso. Sempre gostei de desporto e, acima de tudo, agradava-me a sua presença bem-disposta e animada.
Patrícia ter-se-á iniciado no surf em meados da década de oitenta pela mão do irmão mais velho, Gonçalo Lopes, quando o surf em Portugal ainda era uma raridade. Melhor, quando o surf em Portugal ainda era visto como uma perda de tempo, os surfistas como rebeldes, desafiadores da sociedade, uma cambada de inadaptados, de insubordinados que se recusavam a corresponder às expectativas dos pais, como concentrar todas as energias num curso superior, por exemplo. Mulheres no mar, nessa altura, só a Teresa Ayala em Peniche e a Teresa Abraços na linha. A elas juntou-se a Patrícia na luta pela conquista de espaço numa área (mais uma) dominada maioritariamente, arrogantemente, pelo género masculino.
Fui dar com ela na praia este fim-de-semana, a dar uma aula de surf a um rapaz de 15/16 anos. Já não via a Patrícia em Carcavelos desde o dia em que houve campeonato lá na praia, a contar para o ranking nacional (terá sido quando? Outubro de 2002?). Nesse dia, tenho a certeza de ter assistido a um verdadeiro espectáculo da Natureza, de demonstração da coragem humana, nomeadamente feminina. Lembro-me de que o mar estava enorme (aliás, nunca mais voltei a ver Carcavelos tão grande), a fazer buraco (típico...) e com uma rapidez impressionante (é, afinal, de uma das ondas mais rápidas e cavadas do país que vos falo). Falhar o drop ou a manobra equivalia a apanhar uma valente “coça”, a ser arrastado/a até à areia, debaixo de àgua, aos trambolhões, sem poder respirar durante tempo suficiente para fazer qualquer pessoa passar um mau bocado e ponderar devidamente a sua entrada. Patrícia não pensou duas vezes: vestiu o fato e entrou. Dentro de água, só pude contar os prós em competição e mais meia dúzia de destemidos. E a Patrícia, claro.
Vi-a este fim-de-semana na praia, dizia eu, a dar uma aula de surf. Estava pequeno: meio-metro (talvez nem isso). Patrícia ficou no inside a dar a aula enquanto eu boiava lá fora, à espera de uma ondinha que valesse a pena. A dada altura, virou-se para nós (eu estava com o L.) e disse, fazendo sinal para a esquerda: “Para ali! Remem para ali!”. Assim fizemos. “Mais, Susana, rema para fora!”. Assim fiz. E bastou o tempo que levei a posicionar-me no line-up para entrar o set. Ondas boas (melhores), grandes em comparação com o que tinha estado a entrar ao longo da tarde. Com três braçadas enfiei-me na primeira do set, drop rápido, sem esforço, cortei a onda até à areia. No final, um sorriso do tamanho do mundo. Valeu-me a sorte de ter apanhado a onda do dia. E a dica da Patrícia, claro.
Tudo isto só para dizer que não há quem eu respeite mais do que quem percebe o incompreensível. E é por isso que respeito os surfistas (os que o são verdadeiramente) acima de quaisquer outras pessoas. Porque de Teorias da Comunicação e do Jornalismo até eu consigo perceber, com algum estudo. De física quântica também, suponho, com estudo árduo. Agora o mar... Sobre ele nada vem escrito nos livros.
Susana

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

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11:43 da tarde  

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