domingo, maio 28, 2006

Vencidos da vida

Nos anos mais próximos, tem-se verificado em Portugal uma consciência colectiva de um gritante pessimismo, que à força de tão repetido e reiterado quase que se vem tornando como característica nacional de sempre. Uma espécie de lugar-comum das conversas de elevador ou de tasca. Parece-me certo que o contributo que "Portugal hoje: o medo de existir", de José Gil, teve neste pensamento não é despiciendo. No seu livro há uma tentativa, não sei se consciente ou propositada, de exaltar aquilo que de mais obscuro e pessimista existe por cá. Talvez o surpreendente sucesso editorial da obra seja mais uma prova de que o sentimento pessimista se tornou frase-de-bolso para muitos de nós e, de facto, esteja assente numa grande parte das pessoas. É, no entanto, importante referir que não só como hoje, também no passado houve momentos em que o desânimo pessimista se abateu sobre o país. Particularmente nas passagens de século, nomeadamente com os chamados "Vencidos da Vida", do final de século XIX, que não são mais do que a prova de que o encarnar do pessimismo recolhe elementos profundamente cíclicos. Ontem, como hoje, estas visões tendem a ofuscar leituras mais abertas e, por isso, mais optimistas. Muitas dessas análises existencialistas incorrem no grave erro de aglutinar todas as categorias e variantes dos portugueses numa só. Transformando toda a nação numa espécie de mancha difusa com uma homogeneidade de característcas tão negativas quanto incuráveis. Muita da origem deste senso comum pessimista reside aqui mesmo.
Toda a gente o sabe, mas Portugal é um país onde a elite cultural é exígua e profundamente fechada sobre si própria (onde os teatros nacionais não enchem com obras de raríssima qualidade por via dessa visão de umbigo, por exemplo). Ora, em razão deste fechamento narcisista é infundado pensar que o sentimento das elites é, de facto, um pessimismo do país real e concreto.
Muito do nosso desânimo colectivo vem de termos, nos anos mais recentes, tomado consciência na pele de que muitos dos nossos desejos, a grande maioria deles desenhados com a estrada na União Europeia, não serem possíveis de ser tornados concretos numa só década. A resolução para este imediatismo pulante, em muito maximizado por uma comunicação social tão fechada quanto as próprias elites e levianamente sensível a quaisquer críticas que se lhe façam, é tomarmos real consciência de que o diagnóstico das dificuldades deve ser tão veemente como a descoberta das suas mais eficazes soluções.

João Teago Figueiredo