domingo, novembro 06, 2005

Coisas que se lêem nos livros

Dentro do quarto, sobre a cama, havia um saco grande, cheio de jornais e revistas. Típico: velho hábito de um conhecido do pai, este de oferecer jornais e revistas de toda a espécie ao senhor simpático que tem uma filha a estudar Jornalismo. Ao conferir o conteúdo, porém, surpreendeu-se. Uma edição antiquíssima – quase a desfazer-se - d’Os Lusíadas, com uma imagem do poeta imortal sob o nome “Luiz de Camões” assim mesmo escrito, esvaziava de prioridade e urgência as páginas frescas da actualidade. Ao virar a capa, lentamente, pôde ler:

«Nova edição d’uma biographia do poeta, escripta por Innocencio Francisco da Silva, e annotada por Joaquim João Serpa, seguida d’um dicionário dos nomes próprios, históricos, geographicos e mythologicos, que se encontram no poema, adornada com o retrato de Camões, e com uma estampa do padrão levantado por Vasco da Gama em Melinde».

Depois, folheando o livro ao acaso, pôde ler, muitas páginas à frente - já quase no final -, num espaço em branco por baixo do CLVI canto, escrito cuidadosamente a lápis:

«Este rapaz é um bocado garoto pelo que me disseram. No entanto é imensamente delicado tem um modo captivante, é pois a razão porque eu gosto muito d’elle. Elle no entanto, olha para mim indiferentemente, mas eu (bem sabes como sou) ainda gosto mais dele por isso». Assinado: Maria da Conceição.

E reparou, intrigada, que a página 437 havia sido arrancada. Tal como a 438 e a 439. Folheando o livro ao acaso, foi ali que, por acaso, o abriu: entre as páginas 436 e 440.
Susana