domingo, dezembro 18, 2005

E, já agora, sobre o TGV

Uma vez que o TGV espanhol vai chegar a Vigo, por que não reforçar os nossos serviços Inter-Cidades e Alfa-Pendular até à cidade espanhola? Se formos minimamente realistas, percebemos que o volume de potenciais passageiros para a linha de alta velocidade não a compensará neste século (e provavelmente nem no outro).

Curiosamente, o Governo fala em ligação ferroviária à Europa, mas esquece-se da ligação ferroviária de Portugal.... a Portugal. Porque ela não existe. Exemplo:

Um estudante universitário natural de Odemira encontra-se a frequentar o curso de enfermagem no Politécnico de Beja. A estação de Odemira (o maior concelho do país, sem que o Inter-Cidades do Sul faça nele uma única paragem) fica na aldeia de Amoreiras-Gare. A mais de 20 quilómetros. O rodoviária de Odemira não tem transbordo directo para nenhuma das estações ferroviárias do concelho (a saber, Pereiras-Gare, Santa-Clara - Sabóia, Luzianes e Amoreiras-Gare). Ou seja, não há hipótese de sair do comboio e apanhar um autocarro, ou vice-versa. Da mesma forma, não há nenhum comboio regional que saia de Tunes, por exemplo, e vá para Beja. Há os comboios para a estação da Funcheira, apenas. Para ir para a capital do Baixo Alentejo, este nosso estudante terá de ir de táxi até à Funcheira (uma vez que até ficará mais barato do que ir para as Amoreiras) e, uma vez lá, apanhará um comboio regional antiquíssimo - quase relíquia do Fontismo - para Beja. Se quiser um transporte mais cómodo, terá de ir de Regional ou de Inter-Cidades até ao Pinhal Novo, e apanhar novo Regional até Beja.

Note-se que, quando a rede ferroviária nacional foi renovada e electrificada, o ramal de Beja foi esquecido - como foi o ramal de Lagos, desde Tunes a Lagos, e a ligação Faro - Vila Real de Santo António. À imagem do que aconteceu com a Auto-Estrada do Sul, que não serve o Alentejo, mas o turismo algarvio e as férias dos lisboetas, a renovação ferroviária não serviu o Alentejo, mas os amantes do turismo pseudo-tropical que chegado o mês de Julho rumam a Albufeira e arredores.

Isto tudo para dizer o quê? Que há prioridades ao TGV. Eu só falei do meu Alentejo, que conheço bem - decerto que no Alto Alentejo e nas Beiras haverá situações idênticas. A linha interna é uma prioridade. Talvez se o Governo saísse de Lisboa e fizesse um esforço para conhecer o so-called "país real", percebesse isso.

João Campos