sábado, julho 29, 2006

Isto é como passar de cavalo para burro

Por outras palavras: a vinda para o Alentejo fez-me deixar temporariamente a minha ligação de 16mbps para a velhinha analógica de 56kbps (que funciona sempre a metade...). Isto para dizer à Maria Helena que não consigo descarregar a imagem que me enviou. Tentarei fazê-lo amanhã, no computador de um amigo.

João Campos

terça-feira, julho 25, 2006

Regresso à aldeia

É aquela altura triste do ano, com o calor alentejano, sem companhia, nicotina, e internet de banda larga. Volto definitivamente em Setembro com novidades. Até lá, estarei em serviços ainda mais minímos.

João Campos

quinta-feira, julho 20, 2006

Lamento para a língua portuguesa

não és mais do que as outras, mas és nossa,
e crescemos em ti. nem se imagina
que alguma vez uma outra língua possa
pôr-te incolor, ou inodora, insossa,
ser remédio brutal, mera aspirina,
ou tirar-nos de vez de alguma fossa,
ou dar-nos vida nova e repentina.
mas é o teu país que te destroça,
o teu próprio país quer-te esquecer
e a sua condição te contamina
e no seu dia a dia te assassina.
mostras por ti o que lhe vais fazer:
vai-se por cá mingando e desistindo,
e desde ti nos deitas a perder
e fazes com que fuja o teu poder
enquanto o mundo vai de nós fugindo:
ruiu a casa que és do nosso ser
e este anda por isso desavindo
connosco, no sentir e no entender,
mas sem que a desavença nos importe
nós já falamos nem sequer fingindo
que só ruínas vamos repetindo.
talvez seja o processo ou o desnorte
que mostra como é realidade
a relação da língua com a morte,
o nó que faz com ela e que entrecorte
a corrente da vida na cidade.
mais valia que fossem de outra sorte
em cada um a força da vontade
e tão filosofais melancolias
nessa escusada busca da verdade
e que a ti nos prendesse melhor grade.
bem que ao longo do tempo ensurdecias,
nublando-se entre nós os teus cristais,
e entre gentes remotas descobrias
o que não eram notas tropicais
mas coisas tuas que não tinhas mais,
perdidas no enredar das nossas vias
por desvairados, lúgubres sinais,
mísera sorte, estranha condição,
em que, por nos perdermos, te perdias.
neste turvo presente tu te esvais,
por ser combate de armas desiguais.
matam-te a casa, a escola, a profissão,
a técnica, a ciência, a propaganda,
o discurso político, a paixão
de estranhas novidades, a ciranda
da violência alvar que não abranda
entre rádios, jornais, televisão.
e toda a gente o diz, mesmo essa que anda
por tempos de ignomínia mais feliz
e o repete por luxo e não comanda,
com o bafo de hienas dos covis,
mais que uma vela vã nos ventos panda
cheia do podre cheiro a que tresanda.
foste memória, música e matriz
de um áspero combate: apreender
e dominar o mundo e as mais subtis
equações em que é igual a xis
qualquer das dimensões do conhecer,
dizer de amor e morte, e a quem quis
e soube utilizar-te, do viver,
do mais simples viver quotidiano,
de ilusões e silêncios, desengano,
sombras e luz, risadas e prazer
e dor e sofrimento, e de ano a ano,
passarem aves, ceifas, estações,
o trabalho, o sossego, o tempo insano
do sobressalto a vir a todo o pano,
e bonanças também e tais razões
que no mundo costumam suceder
e deslumbram na só variedade
de seu modo, lugar e qualidade,
e coisas certas, inexactidões,
venturas, infortúnios, cativeiros,
e paisagens e luas e monções,
e os caminhos da terra a percorrer,
e arados, atrelagens e veleiros,
pedacinhos de conchas, verde jade,
doces luminescências e luzeiros,
que podias dizer e desdizer
no teu corpo de tempo e liberdade.
agora que és refugo e cicatriz
esperança nenhuma hás-de manter:
o teu próprio domínio foi proscrito,
laje de lousa gasta em que algum giz
se esborratou informe em borrões vis.
de assim acontecer, ficou-te o mito
de seres de vastos, vários e distantes
mundos que serves mal nos degradantes
modos de nós contigo. nem o grito
da vida e do poema são bastantes,
por ser devido a um outro e duro atrito
que tu partiste até as próprias jantes
nos estradões da história: estava escrito
que iam desconjuntar-te os teus falantes
na terra em que nasceste. eu acredito
que te fizeram avaria grossa.
não rodarás nas rotas como dantes,
quer murmures, escrevas, fales, cantes,
mas apesar de tudo ainda és nossa,
e crescemos em ti. nem imaginas
que alguma vez uma outra língua possa
pôr-te incolor, ou inodora, insossa,
ser remédio brutal, vãs aspirinas,
ou tirar-nos de vez de alguma fossa,
ou dar-nos vidas novas repentinas.
enredada em vilezas, ódios, troça,
no teu próprio país te contaminas
e é dele essa miséria que te roça.
mas com o que te resta me iluminas.

de Vasco Graça Moura

...as razões dos maus resultados dos exames de Português.

João Teago Figueiredo

terça-feira, julho 11, 2006

Fanatismos irreligiosos

Isto surgiu-me a propósito deste artigo do Bruno Cardoso Reis (já agora, há que colocar ali ao lado um link para O Amigo do Povo), que subscrevo na íntegra, acerca do Diário Ateísta. Recordo-me de um dos primeiros pensamentos que me ocorreu, há algum tempo, quando pela primeira vez acedi ao site e li os seus artigos:

"Volta, Afonso Costa, estás perdoado!"

Claro que o conceito de "diário ateísta" está francamente mal aproveitado. Um ateu, no meu humilde entender, é alguém que nega a divindade. Claro que pode-se sempre entrar na discussão sobre o conceito de negação, e se a negação não implica o reconhecimento da existência, mas a lógica ainda não é o meu forte. De qualquer maneira, esta descrição encaixa-se perfeitamente nos senhores e nas senhoras que escrevem o Diário: odeiam a divindade, odeiam as religiões e respectivas manifestações. Destilam esse ódio a um ritmo diário. Quase sempre, claro, contra a Igreja Católica. É moda, entenda-se.

Não se odeia aquilo que não existe... mas já tinha dito não à lógica. É que o Diário não a tem. Se tivesse, proporcionaria discussões interessantes (o ateísmo decerto terá interessantes pontos de vista históricos, sociais, científicos, entre outros, para debater). Para este debate, abriria as portas do seu templo a ateus, agnósticos e crentes de vários credos. Em nome do pluralismo. Em nome de uma discussão viva, de uma troca de argumentos inteligentes da qual todos, comentadores e autores, saíriam a aprender alguma coisa.

Mas não. Ao invés, o Diário dedica 90% do seu tempo a atacar fanaticamente a "fanática" instituição que sempre foi a Igreja Católica. O que é curioso e simultaneamente irónico: acusa o condena de forma fanática. Insurge-se contra os dogmas da Igreja, como o celibato, o matrimónio, o baptismo, e, possivelmente, até contra a extrema-unção. Esquecendo-se, como é evidente, de que freiras, padres, frades, e todos os elementos da igreja católica, seguiram aquela instituição e aquela religião por escolha própria. Nem se coloca a questão da fé. Essa, como dizia Kierkegaard, is beyond logic. Haja bom senso. E coerência.

A condenação dos crimes passados da Igreja também é, como não podia deixar de ser, tema recorrente. Outra vez a mesma falta de coerência. Se a Igreja não lhes interessasse minimamente, as Cruzadas, a Inquisição ou as teorias de conspiração que apontam para a conivência do Vaticano com o Holocausto interessar-lhes-iam apenas de um ponto de vista histórico - e não de um ponto de vista de uma "descristianização". Os crimes da Igreja servem apenas para provar que todos aqueles que nos seus preceitos acreditam são imbecis. Mas nada como dar a voz aos protagonistas:

Façam-me o favor de considerar que é precisamente assim que um ateu vê um cristão, um muçulmano, um judeu ou qualquer outro teísta, tenha ou não a sua fé uma designação atribuída, chame-lhe ou não «uma força superior inexplicável».

Vê-o exactamente, não com superioridade ou sobranceria, mas como uma mera e simples curiosidade antropológica, tão primitiva que é até oriunda da Idade da Pedra.
Vê os ritos e os cultos que o crente pratica como um lamentável desperdício de tempo e tem até pena daquela "pobre gente" pela infantilidade e completa inutilidade dessa prática.
Lamenta até as vidas humanas completamente perdidas e desperdiçadas em oração, em contemplação, em auto-amesquinhamento e em louvor do "Senhor" quando, de facto, não há "Senhor", não há Deus «Cágau» nenhum.

Um crente é, para estes iluminados, uma curiosidade antropológica, primitiva, da Idade da Pedra. A crença é um lamentável desperdício de tempo. O ateu, do alto do seu pedestal (porque este trecho tresanda a complexo de superioridade), tem pena daquela pobre gente, por a sua infatilidade, pelo seu auto-amesquinhamento perante uma entidade que consideram Superior. Isto, estou em crer, é o maior exemplo de tolerância e de respeito para com o próximo que nos últimos tempos tive oportunidade de ler.

Pois para mim, que sou um crente assim-assim, mais a dar para o agnosticismo, um crente é alguém que escolhe empregar (e não desperdiçar) o seu tempo numa religião. É alguém que acredita na transcendência, mas que não sabe porquê. E que considera essa pergunta irrelevante. Acredita, apenas. Alguém que se considera insignificante - porque o somos, de facto (after all, we are all dust of the stars). Alguém que não tem forçosamente de viver ainda no Neolítico. Alguém a quem a crença dá uma última esperança - e que tem o direito de não querer que essa esperança seja roubada. Mesmo que seja falsa - o crente morre com ela. Nunca o vai saber. E que será preferível: morrer numa angustiante realidade, ou numa reconfortante ilusão?

Cada um que escolha a sua.

Mas claro que para os novos discípulos de Afonso Costa, isto não interessa para nada. Eles temtam "abrir os olhos à pobre gente". Os religiosos em geral, e os católicos em particular, são intolerantes, extremistas, dogmáticos, conservadores. Estes ateístas são liberais e tolerantes. No seu blog, há muito que os comentários de crentes desapareceram - se algum ainda subsiste, gabo a paciência. Porque, do que me lembro das primeiras visitas, os crentes que se atreviam a contestar os dogmas dos meninos ateus eram flagelados em praça pública. Não havia qualquer tentativa de debater o que quer que fosse. De argumentar. Mais facilmente se chegava ao insulto. Contentes ficariam eles se a religião, como o fumo, fosse proibida. Se os crentes fossem proscritos. Claro que, sem religião, não existiriam ateus...

E já escrevi de mais. É para compensar a intermitência a que tenho votado os meus blogs. Mas o artigo do Bruno trouxe-me à memória o Diário - que deixei de ler pelos motivos que acima expliquei. Não me dou bem com a intolerância. Como nota final, apenas uma consideração: que os meus filhos sejam, um dia, educados com os valores católicos, não me importará. Ser amigo do próximo, não roubar, não ser preguiçoso ou não matar parecem-me a mim excelentes valores a seguir. Apenas espero, com deus ou sem deus, que não se convertam à intolerância, ao fanatismo.

João Campos

Duas excelentes notícias para a blogosfera:

Lucy Pepper e o Gato Fedorento estão de volta. Finalmente!

João Campos

sábado, julho 08, 2006

É por estas e por outras que é triste o Expresso só valha a pena por pérolas destas:

Basta passear pelo país para entender como a paisagem foi vandalizada, democraticamente vandalizada, por essa glória de Abril que dá pelo nome de «poder autárquico». Uma história sem retorno. Ou, melhor, retorno até há. Mas não existe dinamite que chegue para um serviço completo.

Por João Pereira Coutinho - quem mais? Pena é que a minha assinatura online do Expresso já esteja a fazer tijolo há muito tempo. Enfim. Não é que este pequeno trecho me trouxe logo à cabeça o lendário "chaparro mecânico" que povoa, solitário, a rotunda de Odemira? (note-se que Odemira apenas tem uma rotunda digna desse nome, ao contrário da maior parte das santas terrinhas deste país. Não porque a autarquia não queira, mas porque a vila está encaixada num vale.) Maria Helena, já que aí mora e tanto jeito tem para a fotografia, não quer praticar a sua arte e mostrar aos colegas e leitores o marramacho (que custou para cima de cinco mil contos) que é o ex-líbris de Odemira?

João Campos

quinta-feira, julho 06, 2006

Eficácia

Agora fala-se em vitória nos media, depois da derrota em campo. Mas em quais media? Nos europeus, que olham para a selecção portuguesa com desdém, acusando-os (com alguma razão, e ontem foi triste) de fiteiros e de simularem faltas? Ou quando argumentam, com alguma razão, que chegámos onde chegámos sem fazermos grandes exibições? Salve-se o Ricardo, pois claro.

Do jogo de ontem, não há muito a dizer. Não sendo intencional, o lance do Ricardo Carvalho era penalty. E a mim custa-me mais o lance ter o Ricardo Carvalho envolvido do que o golo em si, já que ele foi, muito provavelmente, o melhor jogador da selecção portuguesa a todos os níveis, e sem dúvida um dos melhores defesas do Mundial. Se um lance idêntico era ou não penalty na área gaulesa... não sei nem me interessa. Não aconteceu. Os outros, foram as fitas do costume. Porque hoje em dia os jogadores de futebol em geral e os portugueses em particular são meninas autênticas, que em vez de correrem para a bola, atiram-se para o chão ao primeiro contacto. Esquecem a bola. Definitivamente, vou converter-me ao rugby.

A França não jogou nada? Pois não. E nós, jogámos? Não. Ou seja, a França, a juntar à sorte que teve, a ganhar jogou o suficiente para não perder. Portugal a perder não jogou sequer o suficiente para empatar. Muitos portugueses diziam que lhes importava mais a eficácia do que o jogo bonito. Ironia das ironias, foram derrotados pela mesma eficácia. A vida tem um irónico sentido de humor.

Enfim. Resta o jogo dos tristes, no sábado. E resta a Itália. Não é apenas anti-francesismo. Mas uma equipa que anda a engonhar 118 minutos para nos dois últimos minutos marcar dois excelentes golos merece ser campeã.

Terminados os problemas técnicos, o país pode retomar a programação normal.

João Campos